Referimo-nos constantemente àquilo que cremos possuir, que é nosso, que nos pertence como se fosse um objecto, uma propriedade registada ou algo conquistado por direito. "´E meu!" E usamos e avisamos desse sentimento de posse às mais variadas situações e contextos:
- "O meu marido..."
- "A minha mulher..."
- "Os meus filhos..."
- "O meu namorado..."
- A minha namorada..."
- "O meu emprego..."
- "O meu cão..."
- "O meu gato..."
- "O meu cágado..."
- "O meu país..."
As nenhuma destas coisas é, de facto, nossa. Relacionamo-nos com elas de alguma forma. De formas menos ou mais intensas. De formas menos ou mais emocionais. De formas menos ou mais apegadas. São... as nossas relações. Mas as coisas em si, as pessoas e outros seres vivos, não são nossos. Nunca foram e nunca serão. São, elas próprias, também donas de um relacionamento connosco, que pode durar pouco ou muito tempo, seja lá o que isso for.
Talvez, nesta perspectiva, nunca possamos perder nada, já que não se pode perder aquilo que nunca tivemos. Talvez a relação mude. Talvez a forma como nos sentimos mude. Talvez as relações se direccionem noutros sentidos. E isso até pode ser bom... mudar, avançar, crescer e ganhar espaço para novas experiências e relacionamentos.
Quando nos libertamos desse sentido de posse... posse muitas vezes inconsciente e noutras nem por isso... talvez nos sintamos mais livres de desfrutar aquilo que se desenvolve à nossa frente. Talvez o medo da ilusória futura perda desvaneça. Talvez o medo do certo e errado deixem de fazer sentido. Porque a única coisa que existe é esta relação agora, com esta pessoa, com este objecto, com esta abstração de coisa, seja um país, uma religião, um clube, uma flor.
Nessa liberdade, talvez nos possamos lançar numa verdadeira exploração da beleza desse relacionamento. Desfrutar tal como é, sem medos do que possa vir a ser. E agora, neste momento de absoluta vivência do que é, guardar cada pedacinho desta espantosa panóplia de sentimentos na coleção de experiências vividas.
Talvez, e esta é a proposta, seja preferível viver a relação a cada momento, em vez de nos tornarmos donos dela. Ser dono de alguma coisa dá muito trabalho, e parece ser um desperdício de energia. Mas experiênciar essa coisa é só... vivê-la ao longo da sua metamorfose, criando espaço para mais experiências com energia e vitalidade, permitindo a sua natural evolução e transformação.. E talvez possas sentir gratidão por todos os momentos experienciados... durem o tempo que durarem.