A mudança parece trazer, para os casos com que me deparei, um novo começo. Até aqui, tudo bem. Mudar é bom, e faz parte da nossa realidade. Já Heráclito de Éfeso afirmava "A única constante é a mudança".
Mas há uma questão a observar...
...o que verdadeiramente te motiva a fazer essa mudança em concreto? E refiro-me à grande mudança ta tua vida. Aquela com que pretendes mudar tudo do avesso e "recomeçar do zero".
O que tenho observado é que existem essencialmente dois motivos - a fuga de algo ou a busca de algo.
Antes de mais, quero deixar claro uma coisa: qualquer dos motivos me parece bem, desde que tenhas a consciência do que te move. É quando não tens essa consciência que podes estar a criar um potencial transtorno no teu caminho.
Ora vejamos... o que tenho observado com alguma regularidade é a fuga da dor.
Parece-me lógico mudar por este motivo. Ou seja, se estou sentado num banco que tem um prego espetado para cima, continuar sentado com ele fortemente espetado no traseiro só parece ser sinal de auto-punição ou masoquismo. É certo que podem existir outros motivos. Por exemplo, a dor de lidar com o desconhecido (a mudança para algo novo) pode ser superior à dor causada pelo prego, mas vamos manter as coisas simples.
A um certo nível, a pessoa tem a noção de que está a fugir de algo em concreto, e que esse algo lhe é desconfortável ou indesejável. Mas pode não estar inteiramente consciente da essência dessa fuga. Diz que foge porque não se sente reconhecida (as pessoas não a entendem ou não reconhecem o seu valor), porque as condições financeiras são péssimas (pagam mal, o país está em crise, lá fora pagam melhor, existem condições mais favoráveis lá fora), e o rol de razões pode-se estender por aí fora. Mais uma vez, está tudo bem. Diria até que, se consideras que te vais sentir melhor noutro lugar ou a fazer outra coisa ou em estares com pessoas diferentes... força! Dá-lhe gás! Vai! Segue aquilo em que acreditas.
A questão é a seguinte: estás a lidar com a essência do que te move?
Mudares para fugir de algo sem teres a sua essência em conta pode simplesmente significar que levas o problema contigo, para onde quer que vás. Nos primeiros tempos vai ser tudo bonito. É aquele estado de graça inicial em que nos deslumbramos com tudo. Mas findo esse período, voltamos ao mesmo. Os mesmos problemas vão surgir, e vais lidar novamente com as mesmas questões.
O que te recomendo a considerar é que, muito provavelmente, as cenas que não resolveres vão contigo, para onde quer que vás, em que situação fores, e que aqui ou lá vais mesmo lidar com elas de alguma forma. Estas questão são normalmente como a nossa própria sombra. Por mais que andemos ou corramos, a sombra está sempre lá ao nosso lado.
E o outro motivo?
Ah... sim! A busca de algo...
A busca parece, à partida, a forma mais fluída de se mudar. Ou seja, não se está a mudar para se fugir a um problema percepcionado, mas sim na busca de algo que se projecta ser diferente ou melhor, e que se prevê nos seja benéfico ou prazeroso.
Aqui o cuidado é outro. Não estamos propriamente a levar uma questão mal resolvida connosco, mas podemos estar a descurar algo que já temos, sem estamos a dar conta disso. Por outras palavras, algumas pessoas passam a vida na busca daquilo que já têm e não sabem que o têm, simplesmente porque não observam atentamente o seu contexto ou a sua realidade devidamente.
E então nestes casos, é errado mudar?
De todo!
Tal como no caso anterior, se aqui não estás a conseguir perceber o bem que já tens, talvez a mudança te ajude a ganhar consciência disso mesmo. Por vezes, a perda leva-nos a valorizar o que temos.
Que mudes pelos teus melhores motivos. E que em toda e qualquer mudança, seja ela por que motivo for, consigas encontrar pelo menos uma experiência e uma aprendizagem que tornem o teu caminho mais rico e a tua vida colorida.