Por exemplo, recentemente vi dois filmes sobre duas lendas do boxe. Um, sobre o "Mãos de Pedra", o famoso Roberto Durán, que teve um percurso muito curioso desde as "favelas" da cidade do Panamá até ao estrelato do boxe. Outro, sobre o indomável "Demónio de Pazmania", de nome Vinny Pazienza, com a sua incrível recuperação após um acidente que quase o deixou paralisado.
Ambas as histórias andam à volta da paixão pela sua arte, neste caso o boxe, e da superação das suas provações. Ambos os atletas passaram por inúmeras dificuldades no seu desenvolvimento. Tanto um como o outro viram-se confrontados com incontornáveis obstáculos, superados pela sua determinação, empenho e criatividade. Os dois passaram por momentos de introspecção, solidão, sensação de falhanço, ou de que tudo, num dado momento, estava perdido. Ambos recuperaram a sua magnificência e ambos contaram com pessoas chave que, em certa medida, os influenciaram no caminho certo. Ambos lidaram com a súbita fama, o deslumbramento da riqueza, a ilusória invencibilidade e a inevitável realidade de que, lá fora, há outros tão bons ou melhores que eles.
O que há de comum é que ambos, sem sombra de dúvidas, acreditavam em si mesmos. Estavam certos do seu caminho, seguros do que queriam fazer, e absolutamente irredutíveis quanto aos seus objectivos Sim, por momentos vacilaram. E sim, momentos depois voltaram à sua essência. Pazienza chegou mesmo a dizer numa entrevista que a maior mentira que já lhe tinham dito foi "Não é assim tão simples." Na opinião dele, é simples! Para se ter uma ideia da atitude e forte convicção pessoal, quando o médico informou Pazienza de que ele não voltaria a praticar boxe (minuto 1'37"), ele respondeu que o médico desconhecia que tipo de homem ele [Pazienza] era.
Nestas histórias, e agora relativamente a estes dois exemplos, sai-se sempre com um sentido de heroísmo. E ambas as personagens têm esse mérito! E fica-se nesse momento heróico eternizado pelos créditos finais do filme ou o ponto final na última página do livro.
A realidade é bem diferente. Não são minutos a lidar com dúvidas, problemas e desafios. São dias, semanas e por vezes meses ou anos. Não são segundos caídos no chão, naquela agonizante dor física e/ou emocional, na dúvida se serão capazes de se voltar a levantar ou, sequer, se isso vale a pena. São, por vezes, minutos, horas ou dias ali deitados, limitados nos seus movimentos, destruídos dos seus sonhos e aspirações, até que se reencontre a motivação para se erguerem mais uma vez.
Na realidade, não se trata apenas de uma boa preparação física. A preparação psicológica é, na minha opinião, fundamental. E para isso, basta ver todos aqueles talentos que ficam pelo caminho, pelo deslumbramento da fama subitamente atingida, nas atitudes inadequadas, sem capacidade de empenho e dedicação, sem auto-disciplina, sem amor-próprio, sem foco no que realmente é importante para si mesmos, Sim, as partes mental e emocional são decisivas para que se chegue mais longe, e não há talento que chegue por si só.
Fora destas histórias contadas em filme ou livros inspiradores, observa-se que ambos passaram por pesadas derrotas. Ambos perderam os seus títulos de campeões. Ambos foram derrotados por knockout, mais que uma vez. Ambos fizeram erros, más escolhas e caminhos duvidosos. Ambos se debateram com a possibilidade de não voltar a entrar num ringue para disputar, outra vez, o tão ambicionado título. Curiosamente, ambos chegaram a debater-se um com o outro, apesar dos seus 11 anos e meio de diferença de idades.
Afinal, o que é que te falta para te superares?