Não quero ser um fervoroso adepto da abolição do "Porquê". Aliás, quero até salientar a importância do "porquê". É fundamental ter o "porquê" nas nossas vidas. "Porque estou a fazer isto?", "Porque estou aqui agora?" ou "Porque é que vou investir nesta tarefa?" podem ser perguntas interessantes e até desbloqueadoras de alguns entraves. Conduz à razão pela qual estamos aqui, à motivação de uma decisão ou comportamento, ou investimento (em coisa ou relacionamento).
O que observo também é o recurso abusivo a esta pergunta. Ela é importante, e fundamental, mas nos seus contextos e momentos certos.
Quando alguma coisa indesejável acontece, ou quando nos sentimos menos bem com algo, o acesso ao "porquê" parece levar a estados que pouco ou nada contribuem para a saída ou desbloqueio da situação. Muitas vezes leva até ao aprofundamento da situação indesejada, cavando-se um buraco cada vez mais profundo e escuro.
A resposta mais comum à pergunta "porque é que isto está a acontecer?" é um apontar de dedos a alguém, ou a si mesmo, como forma de identificar um culpado. Quando se pergunta "porque me sinto assim?", a resposta mais comum é "porque quando era mais jovem..." ou simplesmente "porque sou tótó!".
Por vezes culpa-se o estado as coisas (o governo, a empresa, a família, o condutor do autocarro, o taxista) ou justifica-se com as condições contextuais (a economia, a falta de investidores, as pessoas gananciosas e mentirosas, a traição de alguém importante). Mas isto não resolve, é um mero apontar de dedos, encontro de justificações, sobre as quais dificilmente se pode operar..
Talvez possamos experimentar, nestes casos, uma pergunta diferente.
Se perguntarmos "Como é que isto está a acontecer" ou "Como é que faço para me sentir assim", começamos a olhar para uma parte diferente da situação. E essa parte tem um nome - Processo.
Quando observamos o processo, começamos a identificar as diferentes componentes que, combinadas de certa forma e por determinada ordem resultam num desfecho aparentemente indesejado. E observando esse mesmo processo, como se tratasse de uma receita de um bolo ou a mecânica de produção de veículos, começam-se a identificar partes que podem ser alteradas na sequência, partes novas que podem ser incluídas e partes que podem ser removidas. E alterando-se o processo, altera-se o resultado, na direcção do resultado pretendido.
"Quando me sinto bem, como faço, que tipo de pensamentos tenho, onde me foco mais?"
"Quando acontece o que quero, como faço para que isso aconteça?"
Parece que, quando temos em conta o processo, nos afastamos emocionalmente da situação, conseguindo assim uma operação mais limpa e eficaz sobre o processo, aplicando alterações para estados diferentes. E estados diferentes, e estados diferentes levam a comportamentos diferentes. E comportamentos diferentes, levam a resultados diferentes.
Quando assumimos a responsabilidade sobre o processo, ganhamos o poder de operar sobre ele. E quando operamos sobre ele, obtemos resultados mais próximos daqueles que queremos ter.
Nem sempre as alterações produzem os resultados que queremos. É uma experiência. São passos de tentativa-erro até se conseguir a fórmula certa. Também não serve de escapatória àqueles desafios exigentes. Antes pelo contrário. É uma forma de melhor lidarmos com aqueles desafios exigentes. Por vezes, o preço de uma alteração pode ser elevado, emocionalmente elevado. E só a pessoa que assume a responsabilidade pelo processo pode avaliar esse custo, e decidir avançar.
Então, há momentos para perguntar "Porquê". Há momentos de termos em conta a nossa motivação. A razão pela qual nos lançamos num determinado caminho em detrimento de outro. A intenção de estarmos numa relação em vez de outra. Esse "porquê" é fundamental à sustentação de todo o processo.
E depois há os momentos em que perguntamos "Como". Em que olhamos o processo de obtenção de um resultado. E observando esse processo, operar sobre ele até à obtenção do resultado desejado. E essa operação estará sempre sustentada pelo motivo encontrado no "Porquê". E todo este grande processo - "Porquê"->"Como" - leva-nos ao que efectivamente desejamos concretizar.