- Não! Eu só finjo ser forte. Só finjo ter coragem. Por dentro... tremo de medo. Sinto as forças a desvanecer. Eu esforço-me para que todos pensem que sou forte, que tenho coragem. Queria dar o exemplo... ser um exemplo. Mas é tudo a fingir. Não sou nada disso. Faltam-me as forças, e a coragem... dá-me vontade de rir. Eu, com coragem? Não faz qualquer sentido. É tudo uma máscara... um faz-de-conta...
- E no entanto... estás aqui!
- O que queres dizer com isso? Se tu soubesses como me sinto... o que realmente sou... o cansaço...
- ...quero dizer que... com tanto fingimento, acabaste por dar o exemplo. Foste mais longe e as pessoas seguem-te. Tu és o exemplo de força, coragem e determinação...
- ...mas eu tremo de medo por dentro. Não entendes? Não sei o que fazer... só me apetece fugir, esconder... ir para bem longe daqui. Começar de novo... e... não sei... fugir!
- Sim. Eu entendo.
- Entendes agora?
- Sim... entendo que ter força e coragem implica ter medo.
- hã?
- Repara no percurso que fizeste até aqui. Observa bem todos os passos, todos os obstáculos ultrapassados... e tudo a fingir, não foi? Fingiste tão bem que enfrentaste os teus medos, usaste a força que tens e superaste os obstáculos. É só isso mesmo que interessa... olhares em frente e seguires o teu caminho. Se é a fingir... se é a sério... se é a brincar... pouco importa. Importa que chegaste até aqui, e podes continuar o teu caminho, se for essa a tua intenção. O que é que realmente queres? O que te trouxe até aqui?
[silêncio]
- Não queria nada disto. Só pensei que... não sei. Era suposto, talvez? Era algo que me era esperado. As coisas foram acontecendo umas atrás das outras e... Era suposto resistir, vencer, lutar, ser alguém...
- Já és! Sempre foste.
- Sim?
- Sim!
- Então... posso parar. Posso descansar. Posso relaxar e deixar-me de toda esta luta, este esforço inútil?
- Claro que sim.
- Sim? Sério? E depois? Quem faz o que é suposto eu fazer? Tu?
- Não. Não faz parte do meu caminho.
- Então quem? Sobre eu, não é?
- Não sei. Sobras?
- Tenho de ser eu a fazer isto. Tenho de ser eu a cuidar, a gerir, a pensar no amanhã... a garantir que tudo corre bem.
- Então faz..
- Pois... faço. Porque mais ninguém o vai fazer! Até tu acabaste de dizer que não o vais fazer.
- Sim. Não vou.
- Então?
- Então?
- Então pergunto eu... quem faz?
[silêncio]
- Talvez ninguém o faça. Talvez alguém apareça para o fazer. Talvez nem seja necessário fazer.
- Claro. Deves pensar que as coisas aparecem todas feitas. Caiem do céu.
- Como te sentes agora?
- Com vontade de partir isto tudo. Já que ninguém o faz...
- Então... recuperaste a força e a coragem. Estás com determinação.
- hummm... sim. Há problema?
- Nenhum...
- Óptimo!
- Óptimo.
- E se eu não quiser fazer?
- Está na tua natureza?
- Natureza? O que é isso?
- Está na tua natureza deixares de fazer? Como te sentes e não o fizeres?
[silêncio]
- Estou a perceber...
- Então podes parar de lutar. Segue isso mesmo que acabaste de pensar... esse sentimento que tens agora em ti. É isso. Deixa fluir. Tu sabes o que queres. Sabes porque fazes o que fazes. Sabes perfeitamente o que te motivou a chegar aqui e o que te motiva a seguir em frente. Então segue...
- Sim... sei. É isto mesmo. E o medo?
- Faz parte. É um alerta. É mesmo importante para ti. Abraça-o. Esse medo diz-te algo.
- Diz-me... sim. Que é preciso reunir as minhas forças. Que é necessário preparar as minhas ações. Que é fundamental manter o meu foco.
- E agora? Como te sentes?